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Polêmica envolve projeto de lei que municipaliza gestão da APA de Tamoios, em Angra dos Reis

Por Carol Macedo
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ANGRA DOS REIS

Um projeto de lei complementar polêmico tramita na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj). Trata-se do 41/2021. De autoria da deputada Célia Jordão (Patriotas), ele municipaliza a administração da Área de Proteção Ambiental (APA) de Tamoios, criada pelo Decreto nº 9.452, de 5 de dezembro de 1986. Ou seja, o que é feito hoje de maneira compartilhada com o Governo do Estado, através do Inea, passaria a ficar de responsabilidade apenas de Angra dos Reis. A preocupação, principalmente de 15 entidades que já se manifestaram através de nota enviada à Alerj, é que se virar lei, a prefeitura possa abrir caminhos para empreendimentos imobiliários na cidade e, principalmente na Ilha Grande, que recebeu o título de Patrimônio Mundial da Humanidade.

O município, apesar de ter uma Usina Nuclear, um estaleiro, terminal marítimo, continua sendo um dos destinos mais procurados no turismo no estado e até de fora do país, devido a suas belezas naturais. Há quase 35 anos a APA de Tamoios abrange uma extensão de 22.530,17 hectares em áreas continentais e insulares do município. É toda a extensão costeira de Angra, da divisa com Mangaratiba, até a divisa de Paraty, além de dezenas de ilhas.

O projeto de lei da deputada diz que como condição de integração econômica e desenvolvimento do turismo sustentável da Costa Verde, ficaria estabelecida a municipalização da APA de Tamoios. Com isso, cada cidade da região seria autorizada a rever o zoneamento do plano de manejo da respectiva área de proteção ambiental existente no seu território, flexibilizando ou restringindo-as de acordo com estudos técnicos. “É de competência municipal, o licenciamento de construção e/ou reforma de obras necessárias à melhoria do saneamento ambiental e do desenvolvimento ao turismo, seja pública ou privada, no ambiente terrestre e/ou marinho; tais como, as instalações e estruturas de apoio náutico; em conformidade com a Lei Complementar nº 140, de 8 de Dezembro de 2011”, diz o parágrafo quinto do artigo primeiro do projeto de lei.

CONTRA O PROJETO

Assinam a nota enviada para Alerj 15 entidades de Angra dos Reis, como a Sociedade Angrense de Proteção Ecológica (Sapê), Associação de Meios de Hospedagem da Ilha Grande (AMHIG), Movimento Baía Viva, Instituto de Educação de Angra dos Reis da UFF, Fórum de Comunidades Tradicionais de Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba, Associação dos Moradores Tradicionais e Amigos da Parnaioca, Associação de Moradores do Aventureiro, Associação de Moradores de Enseada das Estrelas, Associação de Moradores, Pescadores e Barqueiros da Praia do Bananal, Associação de Moradores da Praia Grande de Palmas, Associação de Moradores de Marariz, Ecomuseu Ilha Grande – Uerj, Associação de Remanescente do Quilombo de Santa Rita do Bracuí, Associação de Moradores da Praia do Retiro e Liga Cultural Afro-Brasileira.

Rafael Ribeiro é conselheiro da Sapê. Ao A VOZ DA CIDADE citou que é preciso ressaltar a importância de uma unidade de conservação. E a de Tamoios garante o uso sustentável graças a gestão compartilhada. “A APA sendo também estadual tem um pouco mais distante toda a pressão de especulação imobiliária. Passando para a prefeitura entendemos que ficará frágil essa questão. Significa facilitar as últimas áreas que ainda são protegidas a serem perdidas”, disse.

A nota das entidades é contrária ao argumento usado no projeto de lei que sugere que a atual configuração da APA de Tamoios restringe o desenvolvimento local. As entidades afirmam que a legislação favorece as dinâmicas locais, garantindo que as populações residentes exerçam de forma autônoma e sustentável o turismo, a pesca e a maricultura. “É superficial, portanto, o argumento de que a legislação ambiental é um entrave ao desenvolvimento do turismo. Ao contrário, uma mata preservada e uma baía de águas limpas conferiram a Angra dos Reis notoriedade internacional e um potencial turístico como poucos no mundo”, disse, referindo ao fato da Ilha Grande ter conquistado o título de Patrimônio da Humanidade pela Unesco.

O documento ainda cita a APA da Banqueta, gerida pela prefeitura, que deveria servir de proteção a principal área de captação de água da cidade, responsável pelo abastecimento da grande Japuíba e Centro. “A Unidade não tem Plano de Manejo, nem conselho gestor e nunca teve equipe técnica ou gestor definido, ou seja, nunca teve gestão organizada. Nem sequer a Unidade de Conservação é citada no site da Prefeitura, que somente faz menção ao recente Parque Natural Municipal da Mata Atlântica, criado em 2017 e também sem qualquer instrumento de gestão estabelecido até então”, diz a nota.


CAIÇARAS

Caiçaras são habitantes tradicionais da cidade, que vivem da sua cultura, pesca artesanal, artesanato e ecoturismo. Dois que não se identificaram, declararam ser contrários ao projeto de lei. Um morador do Abraão citou que é a favor da preservação e sabe que com o projeto isso pode ficar comprometido. Outro, da Praia Grande de Araçatiba, mencionou que o Inea, mesmo com todos os problemas, faz um trabalho importante na cidade. “Sabemos a bagunça que será se isso acontecer em Angra”, diz.

PELA PRESERVAÇÃO

A deputada estadual Célia Jordão, em entrevista ao jornal disse que a principal ideia contida no projeto de lei complementar é respeitar as regras de proteção ambiental para se estabelecer o desenvolvimento sustentável, segundo as diretrizes da Lei Federal 9985/2000. “É importante ressaltar que o tema ainda será objeto de debates na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e nas audiências públicas promovidas futuramente pelas Comissões. Vamos ouvir todos os setores envolvidos: comunidade, instituições, prefeitura”, argumentou.

Deputada Célia Jordão – Foto: Divulgação

Questionada sobre o motivo da APA de Tamoios sair da gestão compartilhada explicou que essa área está localizada exclusivamente na cidade e está há 35 anos apenas no papel. Afirma que a APA está na classe não estruturada e em fase de implementação, segundo o site do Fundo da Mata Atlântica, dados de 2018. Cita ainda que a área engloba grande parte da área urbana da cidade. Segundo a deputada, a cidade tem estrutura e equipe para absorver essa gestão da APA. “A unificação da governança propiciará a solução de problemas locais com mais celeridade, sobretudo na fiscalização de ilícitos”, diz.

Sobre a APA da Banqueta, a deputada, que é esposa do prefeito Fernando Jordão, diz que o bairro Banqueta já possuía uma expressiva área de ocupação urbana quando a APA foi criada e que conteve o crescimento desordenado na área do manancial que abastece a cidade, trazendo, segundo ela, enorme benefício para a população.

Finaliza dizendo que é nascida em Angra dos Reis e quem é de lá sabe que a preservação da natureza e de seus recursos naturais são essenciais para os moradores e para o desenvolvimento sustentável para promoção do turismo e geração de emprego. “Ninguém vai para Angra para ver prédio, e sim as belezas naturais. A Baía da Ilha Grande é patrimônio mundial da Unesco e, acima de tudo, patrimônio da humanidade. Precisa e deve ser preservada”, argumenta Célia Jordão.

TRAMITAÇÃO

Atualmente, o projeto de lei está para relatório da Comissão de Constituição e Justiça da Alerj, cuja presidência é do deputado Márcio Pacheco. No início do mês passado ele teria enviado o projeto para o Inea emitir uma análise de sua viabilidade. Procurado pela equipe do A VOZ DA CIDADE, não tinha respondido o contato feito por email até o fechamento desta edição. A intenção era saber se ele já tinha o relatório finalizado.

 

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