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Machismo dá sinais de que comportamento social está longe do ideal

Por Andre
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SUL FLUMINENSE

A goleada fora de campo que sete brasileiros deram contra uma russa na última semana repercutiu tanto quanto o mesmo placar dentro das quatro linhas contra a Alemanha, em casa, na última Copa do Mundo. Fazendo chacota com o órgão sexual feminino e incitando a mulher a reproduzir o mesmo discurso, em língua desconhecida por ela, os canarinhos externaram o arcaico modo masculino de configurar o feminino.

O homem, por uma ignorância absoluta, relega a mulher a segundo plano para exercer sobre ela um domínio

Gilberto Caldas – Sociólogo e antropólogo

Segundo o sociólogo e antropólogo de Resende, Gilberto Caldas, esse comportamento enraizado tem origem na própria estrutura da sociedade. No caso brasileiro, às origens; à própria cultura. Também destaca que a sociedade não se desenvolveu mais porque o homem ainda trata a mulher como um ser inferior. “A colonização portuguesa e a influência europeia contribuiu muito para esse tipo de pensamento. Não podemos deixar de lembrar que nós temos uma cultura judaico-cristã; cultura religiosa predominante. Mesmo com o avanço significativo da religião evangélica que vem desde Lutero, esse viés religioso de que a figura masculina se sobrepõe à feminina conserva muito esse comportamento. Um estudo comparativo entre as religiões europeias e orientais aponta que o homem, por uma ignorância absoluta, relega a mulher a segundo plano para exercer sobre ela um domínio. A psicologia chega à conclusão de que a humanidade perdeu uma grande oportunidade de um desenvolvimento maior exatamente porque o homem, ao invés de dividir as tarefas com as mulheres sempre a inferiorizou”, explicou.

O A VOZ DA CIDADE foi às ruas de Barra Mansa e ouviu o que as mulheres pensam sobre o episódio ocorrido na Rússia.

Para a promotora de vendas Rayane de Souza Reis, mesmo com roupas normais, muitas mulheres chamam a atenção e homens, machistas, não se contentam apenas em vê-las.

“Tem que mexer, falar alguma coisa. Brasileiro já é mal visto lá fora e atitudes como essa, na Rússia, só comprovam isso, infelizmente”, lamentou.

Quem também desaprovou o comportamento dos compatriotas, Foi Gabrielly Cecília Dorneles, também promotora de vendas.

“Muitas mulheres realmente se vestem de forma vulgar. Mas não justifica; nada justifica fazê-las repetir frases vexatórias em outro idioma ou achar que pode expressar suas vontades ao ver uma mulher na rua sem o consentimento dela. É preciso ter respeito”, destacou.

Argumento x força

Dentro da filosofia de que o mais forte fisicamente prevalece – daí o caráter provedor do homem; da família patriarcal, revelam-se verdadeiros absurdos que prevalecem até hoje. “Quando falta o argumento, prevalece a força. Originariamente, acreditava-se que a mulher tinha um poder de sedução capaz de dominar o homem e destruir as famílias; então essa é a ideia central. O poder de sedução da mulher é tal que ela é capaz de dominar – podemos ver grandes nomes na história: Maria Antonieta, Marquesa de Santos… há sempre uma mulher muito próxima ao poder constituído que faz o giro do negócio. Então, na antiguidade, por eles acharem que a mulher era tão perigosa, deveria ser manietada (de mãos atadas; sem poder reagir). O apóstolo Paulo, por exemplo, que antes da conversão ao cristianismo era Saulo, ao escrever suas cartas, que constam na Bíblia, podemos perceber claramente que ele vem perdendo suavemente o pensamento de rabino/judeu desse estigma sobre a mulher; do ranço do domínio de um sobre outro. Até que no fim de suas cartas ele busca a igualdade entre os dois seres. Hoje nós vivemos isso na sociedade brasileira de uma forma muito radical. Ainda há esses preconceitos; esses paradigmas, mas é por pura ignorância”, destaca Gilberto Caldas.

Real x ideal

Com o fato de que muitas mulheres são responsáveis pelas famílias, houve uma perda do poder patriarcal. Mas para atingir a mentalidade de que os direitos são iguais, segundo o sociólogo, ainda demora um pouco. “Não é uma realidade totalitária; é uma realidade aceita. Há duas figuras na sociologia que são muito importantes – a assimilação e a acomodação – a maioria dos machistas, por exemplo, se acomodaram, mas não assimilaram; não agem naturalmente; partindo de um comportamento interior”, disse.

Lei Maria da Penha

“O poder familiar presta à mulher hoje essa liderança; esse “poder” de igualdade; independência. Hoje, se acredita em funções, responsabilidades iguais e deveres diferentes. Por exemplo, eu (homem) posso ser ou não o provedor da casa, mas não posso parir nem dar de mamar. Por uma distorção, uma geração inteira foi criada pela mãe não deixando que o homem lavasse a louça, roupa, cozinhasse… porque era “coisa de mulher”; então as próprias mulheres criaram os machistas. Aí o homem procurava no casamento uma mulher com o mesmo comportamento. Isso está sendo desconstruído agora, mas é devagar. Aí, essas manifestações (dos brasileiros na Rússia) nos deixam claro que a transformação da concepção sobre a mulher não aconteceu na sociedade como um todo. Não é uma coisa natural ainda. Temos muitos machistas acomodados; não assimilados. Os brasileiros agiram com o preconceito natural; enraizado dentro deles, que fluiu lá”, esclareceu Caldas.

Direitos e funções


Como a sociedade não dá saltos, mas sim caminha passo a passo somos muito menos bárbaros do que fomos ontem, mas ainda somos bárbaros.

“Isso tende a diminuir, mas é uma luta constante; devemos sempre lembrar dessa necessidade de responsabilidades e direitos iguais, mas funções diferentes. A mulher não é diferente do homem em nada. São serem complementares fisicamente e psicologicamente”, concluiu.  

Comportamento de torcedores na Rússia pode configurar importunação ofensiva ao pudor

SUL FLUMINENSE

Segundo a historiadora, especialista em Gênero e Sexualidade e bacharelanda em direito, Priscila Cristine Souza, pelo ordenamento jurídico brasileiro, a conduta dos sete torcedores na Rússia pode ser enquadrada em importunação ofensiva ao pudor; que é considerada uma modalidade de contravenção penal.

“A importunação ofensiva ao pudor diz respeito a um ataque à dignidade sexual de alguém. Ao submeterem uma mulher – que não entende o nosso idioma – a uma exposição pública, violando a sua intimidade, esses homens escancararam a desigualdade existente nas de relações de poder entre os gêneros. Desse modo, expuseram a moça ao constrangimento, à humilhação e vulnerabilidade. Temos uma cultura machista e misógina e isso não é novidade. As feministas estão há tempos denunciando isso. Acontece que não só no Brasil, mas no mundo, é costumeiro naturalizar comportamentos violentos (histórico e culturalmente produzidos) de homens em relação às mulheres. Invadir o corpo e a intimidade de alguém é violência”, disse Priscila.

A bacharelanda em Direito destacou ainda que fazer piada e chacota acerca do órgão sexual de uma mulher é objetificá-la. “Objetificar alguém é retirar-lhe humanidade e dignidade. Estamos falando de uma das piores violências que as mulheres do Brasil e do mundo sofrem – a objetificação. É importante lembrar aos ‘quarentões’ de verde e amarelo que só existe brincadeira quando há consenso e não há violência. Dentre os homens que praticaram essa violência, está um advogado que sabia muito bem a gravidade dos seus atos. Não podemos colocar a culpa na bebida por uma violência cotidiana e histórica. O que eu percebo não é que exista uma falta de assimilação, mas sim resistência dos homens em reconhecer que as mulheres estão mais conscientes dos seus direitos; donas dos seus corpos e aspirações e isso causa choque entre quem acha que tem o direito natural de oprimir e dominar e de quem não aceita mais ser oprimida”, disse.

O aumento da punibilidade (Lei Maria da Penha, por exemplo) não dá conta de modificar o ethos da sociedade (costumes de um povo) que permanece/permaneceu machista, misógina, racista e homofóbica. “É por esta razão que mais do que criar leis que punam, sejam criados dispositivos que dialoguem com a sociedade civil, políticas públicas eficientes no combate a essas violências históricas e tão cotidianas. Nesse sentido, barrar o debate de gênero nas escolas é contribuir para a perpetuação desse machismo estrutural presente nas relações do cotidiano. Proibir esses debates tão necessários é dizer à sociedade que não há interesse do Estado de que as coisas mudem; de que precisam ser mudadas. Afinal, o nosso Congresso é predominantemente masculino, heteronormativo e branco e, como tal, se beneficia dos privilégios que nós mulheres, os negros e negras, e LGBTs não têm”, concluiu a especialista.

Cartão vermelho

Um vídeo em que homens brasileiros aparecem assediando uma mulher russa durante a Copa do Mundo viralizou nas redes sociais na última semana. Nas imagens, eles se divertem cantando músicas em alusão à cor do órgão sexual da mulher. Fica claro, no vídeo, que a vítima não entende o idioma português e os homens a incentivam a repetir a frase dita pelo grupo como se fosse um hino de torcida.

Enquete

“Mesmo com roupas normais, muitas mulheres chamam a atenção. E homens, machistas, não se contentam em apenas olhar; têm que mexer, falar alguma coisa. Brasileiro já é mal visto lá fora, e atitudes como essa, na Rússia, só comprovam isso, infelizmente”.

Foto: Fábio Guimas

(Rayane de Souza Reis)

“Muitas mulheres realmente se vestem de forma vulgar. Mas não justifica; nada justifica fazê-las repetir frases vexatórias em outro idioma ou achar que pode expressar suas vontades ao ver uma mulher na rua sem o consentimento dela. É preciso ter respeito”.

Foto: Fábio Guimas

(Gabrielly Cecília Dorneles)

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