SUL FLUMINENSE
O país vem enfrentando uma das piores crises hídricas das últimas décadas e, diante da falta de chuvas, diversos reservatórios de hidrelétricas estão próximos do nível mínimo para a geração de energia elétrica. Os sistemas do Sudeste e Centro-Oeste têm a situação mais crítica, e operam hoje com o volume médio de 20% da capacidade. O ambientalista e professor de Recursos Hídricos do IFRJ, além de membro da diretoria Comitê de Bacias do Médio Paraíba do Sul, José Arimathea Oliveira, alertou que a situação do Rio Paraíba do Sul não está muito distante desta realidade e destacou que o sinal já está amarelo e que os municípios cortados pelo rio já deveriam estar tomando medidas de prevenção, como a conscientização do uso racional de água.
Além de tornar a energia elétrica mais cara, a crise hídrica pode ser bem mais prejudicial do que se imagina, dificultando a captação e distribuição de água para os municípios. Arimathea relatou ao A VOZ DA CIDADE que os níveis das represas instaladas no Rio Paraíba do Sul já estão em torno de 25% da capacidade de água que conseguem acumular. Para chegar a esse resultado é realizada uma análise do quantitativo de cada reservatório, uma vez que cada um tem um tamanho diferente. No estado do Rio de Janeiro, há apenas uma represa, a do Funil, no município de Resende, as outras três estão em cidades de São Paulo.
Questionada, a Usina de Funil informou que o reservatório encontra-se atualmente na elevação 454,88 metros, o que representa um volume útil de 37,59%. A Usina está operando com uma geração média em torno de 86 MW, o que corresponde a 40% da capacidade instalada, sendo que a capacidade é de 216 MW. Segundo Arimathea, esses números são alarmantes por diversos fatores: um deles é a escassez de chuva, que deve voltar a ser volumosa apenas em novembro; o segundo motivo é pelo Sistema Cantareira.
“Além da falta de chuva, que vem prejudicando o país, após a última crise hídrica de São Paulo, no Sistema Cantareira, que ocorreu em meados de 2013, o Governo Estadual autorizou uma obra de grande porte para retirar a água do Rio Paraíba do Sul para abastecer a região metropolitana”, relatou o ambientalista, completando que o Cantareira já está em sinal de alerta. “Então já há previsão para retirar águas do Paraíba para fazer uma reserva de segurança e isso vai diminuir mais a capacidade de água e energia elétrica da nossa região”, relatou destacando que isso será um efeito cascata.
Arimathea contou ainda que, em Barra do Piraí, são tirados 2/3 da água para abastecer a baixada Fluminense no Rio de Janeiro. Os municípios que vêm depois de Barra do Piraí estarão em uma situação ainda pior, principalmente a última cidade em que o Rio Paraíba passa, em São João da Barra. “Com o nível baixo, o rio perde força para desaguar no mar, sendo assim, ao invés de invadir o oceano, é o oceano quem invade o rio, principalmente por causa da força da maré, prejudicando ainda mais a população dessa cidade”, lamentou.
A ÚLTIMA CRISE
O ambientalista relembrou a última crise que ocorreu há seis anos no Rio Paraíba do Sul. “Em 31 de agosto de 2013, os índices de reservas das represas eram de 57%. Em um ano caiu para 18%. Já em 2015, que foi o ápice da crise, chegou a 7%”, disse, destacando que atualmente esses 25% em que se encontram as represas estão próximos ao nível de quando a região começou a entrar na crise em 2014. “É alarmante, pois já temos uma tendência de entrar em um período difícil de abastecimento de água na nossa região se não houver uma preocupação dos órgãos de abastecimento de água”, alertou.
Para Arimathea, a conscientização não deveria ser abandonada nunca, uma vez que, mesmo em períodos chuvosos, há localidades que não recebem água, como os bairros mais afastados e em pontos altos. “Mas agora, principalmente, tem que ter racionamento. Evitar banhos demorados, evitar lavar roupa com pouca coisa na máquina, aproveitar águas para lavar quintais e calçadas, fechar a torneira para escovar os dentes. Essa conscientização tem que ser feita”, afirmou.
CONSEQUÊNCIAS
“A represa do Funil já está operando bem abaixo da sua capacidade. E esse volume de água que tem no rio hoje, é um volume artificial que está sendo guardado pelas represas”, disse Arimathea, explicando ainda que as pessoas podem olhar para o Paraíba e não enxergar o nível tão baixo, mas o problema é que, mesmo que não seja aparente aos olhos durante o cotidiano, as bombas das estações de captação de água podem começar a sugar areia. “Além disso, se o nível baixar muito pode ter uma queda na qualidade da água, isso porque o Rio funciona como um diluidor de esgoto, se houver pouca água, o impacto do esgoto no Rio é maior” disse.
REFLEXO
José Arimathea ainda destacou que os intervalos entre as crises por falta de água estão cada vez mais curtos e destacou que uma das causas é reflexo do desmatamento da Amazônia. Uma matéria do G1, publicada no dia 2 de julho, apontou que apenas neste primeiro semestre de 2021, o desmatamento ocorreu em uma área de 3.325km², o que equivale a duas cidades de São Paulo. É a maior estatística dos últimos seis anos. “As pessoas acham que salvar a Amazônia é puro capricho, mas o que poucos sabem é que esse desmatamento é um problema para a gente e impacta diretamente na falta de chuva”, disse.
O ambientalista explicou que as folhas e plantas fazem a evapotranspiração, que funciona como o corpo humano quando sua. “quando isso ocorre, vão se formando os rios voadores, indo para atmosfera. Como a floresta fica perto da Linha do Equador, há muita evaporação. Uma corrente de ar que entra no país pelo Nordeste, sopra essa umidade para Cordilheira dos Anjos, que em seguida volta descendo para o Centro Oeste e Sudeste do Brasil. Quando aumenta o desmatamento da floresta, diminui a quantidade de água que a floresta tem capacidade de jogar para a atmosfera”, finalizou.