Por Silas Avila Jr
Nova York — Ao anunciar, durante seu discurso de abertura da 80ª Assembleia Geral da ONU, que pretende se reunir com Luiz Inácio Lula da Silva em Nova York, Donald Trump não apenas incluiu o Brasil em sua agenda diplomática: sinalizou que enxerga Brasília como ator central em um tabuleiro geopolítico cada vez mais fragmentado.
O gesto chama atenção por ocorrer em um momento de tensão entre os dois países. Nas últimas semanas, o governo norte-americano ameaçou impor tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros, numa tentativa de pressionar Lula a rever o alinhamento com parceiros do BRICS e a postura crítica em relação às sanções unilaterais de Washington. O anúncio do encontro, portanto, soa como uma manobra calculada: ao mesmo tempo em que exibe firmeza em público, Trump deixa a porta aberta para a negociação direta.
Mais do que uma bilateral pontual, a menção ao encontro tem peso simbólico. Para Trump, trata-se de mostrar ao mundo que os Estados Unidos ainda são capazes de dialogar com lideranças que hoje orbitam um espaço político mais autônomo, como é o caso do Brasil. Para Lula, a reunião é uma oportunidade de reafirmar a defesa da soberania brasileira, tema que já lhe rendeu aplausos em seu discurso na ONU, e de posicionar o país como interlocutor entre o Norte e o Sul globais.
Há também um cálculo doméstico. Trump, em plena disputa interna pela consolidação de sua agenda internacional, precisa demonstrar que não está isolado, sobretudo frente a aliados europeus desconfiados de sua retórica protecionista. Ao citar Lula, coloca em evidência um líder do Sul Global que, apesar das divergências, não pode ser ignorado.
O encontro, se de fato ocorrer, terá desdobramentos que vão muito além do protocolo diplomático. Ele pode redefinir o tom da relação bilateral para os próximos anos, abrindo espaço para cooperação em áreas como energia, meio ambiente e comércio, ou, ao contrário, reforçar o clima de confronto caso prevaleçam as tarifas e disputas comerciais.
No fundo, o anúncio de Trump revela o quanto Brasil e Estados Unidos precisam um do outro neste momento de instabilidade global. A ONU foi apenas o palco: a disputa real será no campo das negociações bilaterais, onde soberania e pragmatismo terão de conviver lado a lado.