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Medo e aflição: barra-mansense fala sobre desafios enfrentados pelo marido após seis dias de guerra no Sudão

Por Lara Salles
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RIO/CARTUM

LARA SALLES

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O A VOZ DA CIDADE conversou nesta quinta-feira, dia 20, com a esposa de um dos jogadores brasileiros que está no Sudão, onde acontecem desde sábado, dia 14, os confrontos entre paramilitares e as forças do governo. A barra-mansense, Blanca Bullos, falou sobre os medos e os desafios que o jogador carioca Paulo Sérgio está enfrentando em meio à guerra. A família está recorrendo ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil, para conseguir trazer o jogador, que está na capital do país, Cartum, de volta para casa. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), após seis dias de confrontos, já são mais de 330 mortos.

Paulo Sérgio nasceu na comunidade Tavares Bastos, no Catete, Zona Sul do Rio de Janeiro. Ele e Blanca são casados e têm uma filha de seis anos. Atualmente as duas moram no Rio de Janeiro, mas o pai de Blanca ainda mora em Barra Mansa, é o ex-vereador, o médico Francis Bullos.

Com passagens pelo Flamengo, Juventude, Ponte Preta e Operário (PR), o atacante, de 33 anos, estava disputando o Campeonato Paulista quando recebeu o convite para atuar pelo Al-Merreikh, no Sudão. Paulo e os outros jogadores brasileiros assinaram o contrato com o clube em janeiro.

Na sexta-feira, dia 14, Paulo Sérgio e os jogadores foram para um hotel para se prepararem para um campeonato. A partida estava prevista para o sábado, mas não aconteceu, pois os conflitos tinham acabado de começar no país.

‘ELE ACORDOU COM BARULHO DE TIRO E BOMBA’

Blanca Bullos conta que um dia antes do confronto não existia rumores sobre uma possível guerra, pelo contrário, a cidade estava tranquila. “Já no dia seguinte ele acordou com esses barulhos, me mandou uma mensagem falando que estava escutando muitos tiros e bombas. A princípio, achei que seria algum confronto entre eles, mas que passaria em um dia. Não imaginei que teria essa extensão”, relatou.

Na segunda-feira, dia 17, Paulo, um fisioterapeuta brasileiro e outro integrante do grupo que é colombiano, decidiram sair do hotel e voltar para o prédio onde moram. Para isso, eles usaram um triciclo motorizado com cabine de transporte para passageiros, conhecido como tuk-tuk. Blanca relata que apesar do trajeto demorar em torno de oito minutos, o marido e os integrantes do time passaram por momentos intensos de aflição. “O condutor do tuk-tuk  é sudanês e passou o trajeto inteiro falando no telefone com outras pessoas para saber qual rua eles podiam entrar devido a área intensa de bombardeio em que estavam localizados”, explicou.

ESCASSEZ DE ÁGUA, COMIDA E ENERGIA


Os nove brasileiros que compõem o time, são jogadores ou fazem parte da comissão técnica. Seis são do Rio de Janeiro, um do Paraná, outro de São Paulo e um de Minas Gerais. Todos estão trancados dentro do mesmo prédio esperando uma oportunidade para voltar para o Brasil. Enquanto isso não acontece, a segurança é relativa e os recursos estão acabando.

Blanca relata que para conseguir sobreviver o time está fracionando os recursos. “A água tem hora que acaba e depois volta, só que em uma quantidade pequena. A energia cai constantemente e, por isso, é difícil conseguir contato. A alimentação também já está bem escassa. Eles estavam comprando alimentos em um mercado que fica embaixo do prédio onde estão, mas agora o dono foi embora para outra cidade e a única alternativa é fracionar o máximo possível de comida para não acabar”, explicou.

Ruas desertas – arquivo pessoal/Paulo Sérgio

HOSPITAIS DESATIVADOS

Após seis dias de combate, o Sindicato dos Médicos do Sudão informou que 70% dos hospitais em Cartum e nos estados vizinhos, estão fora de serviço. Ao todo, nove hospitais foram bombardeados e 19 submetidos à evacuação forçada, enquanto os 22 que ainda estão em funcionamento total ou parcial, estão à beira de um colapso. “Eles estão sem nenhuma ajuda médica, não têm estrutura hospitalar e mesmo que não aconteça uma tragédia relacionada à guerra, se alguém sofrer um acidente doméstico, por exemplo, não tem o que fazer”, contou Blanca.

BLANCA E FILHA EMBARCARIAM ESSA SEMANA PARA O SUDÃO

Há quase 100 dias sem ver o marido, Blanca e a filha de seis anos iriam embarcar essa semana para o Sudão. “Só não tínhamos ido antes porque minha filha está passando pelo período de alfabetização na escola, então para ela largar seria complicado. Antes disso tudo acontecer já estava combinado de passarmos dez dias lá e acabou que não fomos, graças a Deus”, falou, completando que sua filha não entende muito bem o que está acontecendo, mas já percebeu que as coisas estão diferentes.

‘ESTAMOS DE MÃOS ATADAS E SEM APOIO DO ITAMARATY’

Questionada sobre como andam os trâmites para que os brasileiros consigam retornar ao país, Blanca informou que até na quarta-feira, dia 19, nenhum representante do Ministério das Relações Exteriores do Brasil (Itamaraty) havia entrado em contato com a família ou com os jogadores. “Só estamos em contato com eles agora porque conseguimos um número de WhatsApp para falar, mas fomos nós quem corremos atrás. A representante da embaixada do Brasil no Sudão não fala nada com nada. Estou aflita e preocupada, tentando dar um suporte para os meus sogros que já são idosos. É uma situação que não podemos fazer nada além de pedir ajuda ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil para que tomem alguma atitude e tirem eles de lá”, lamentou, completando que o Brasil é único país que não está prestando o apoio necessário. Diferente de outros países.

Ela e a família reforçam que a ajuda do Itamaraty é de extrema importante para volta dos brasileiros. “Uma coisa que está me deixando muito chateada é que eles não estão prestando apoio nem nessas questões de necessidades básicas como água e alimento. O máximo que eles falaram, foi que vão tentar conseguir um delivery (para comida) quando a situação estiver mais tranquila. Não sei se isso é falta de vontade, realmente não sabemos o que está acontecendo. Eles não estão dando apoio psicológico nenhum nem para família, nem para os brasileiros que estão lá. Estamos indignados”, ressaltou a barra-mansense.

ITAMARATY SE PRONUNCIA

O A VOZ DA CIDADE entrou em contato com o Ministério das Relações Exteriores do Brasil que informou que está em contato com 21 brasileiros que vivem no Sudão e com seus familiares no Brasil ‘de modo a prestar toda a assistência possível aos nacionais’. “O governo brasileiro tem mantido coordenação com outros países que também têm cidadãos em território sudanês sobre ações coordenadas de assistência, a serem eventualmente implementadas a partir do momento em que as condições de segurança permitir”, disse a nota.

 

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