SUL FLUMINENSE
Para auxiliar empresários a enfrentar a crise financeira imposta na economia global pela pandemia do coronavírus (Covid-19) sem gerar demissão de trabalhadores, o governo federal lançou em abril o Programa Emergencial do Emprego e da Renda (BEm). Nesta segunda-feira, dados do governo federal indicavam que o programa registrava mais de 18 milhões de empregos preservados e acordos celebrados, abrangendo aproximadamente quase 1,5 milhão de empregadores e 10 milhões de trabalhadores.
O BEm permite as empresas a formalizar por até seis meses a redução de jornada de trabalho e salário nas proporções de 25%, 50% e 75%. Ou ainda, propor ao funcionário a suspensão do contrato de trabalho. Medidas que podem afetar o cálculo de outro benefício muito aguardado pela maioria dos assalariados: o abono do 13º salário.
De acordo com a advogada Lailla Finotti de Assis Lima, da SEA Advocacia. A profusão de medidas legislativas decorrentes da pandemia da Covid-19 tem trazido aos profissionais do Direito do Trabalho e de Recursos Humanos uma série de dúvidas quanto aos efeitos práticos das medidas instituídas pelo governo nos contratos de trabalho, especialmente em razão das regras criadas pelas Medidas Provisórias nº 927 e nº 936 – ambas convoladas em Lei. Lailla Finoti explica que o 13º salário tem natureza de gratificação natalina e está previsto na Lei 4.749/1965.
Todo trabalhador que atuou por 15 dias/mês ou mais durante o ano e que não tenha sido demitido por justa causa tem direito à gratificação – ainda que proporcional ao período laborado. “Um exemplo é o empregado que trabalhou por seis meses e 15 dias, que deverá receber 7/12 de seu salário a título de 13º salário. A gratificação pode ser paga de forma parcelada (duas vezes) ou por meio de uma parcela única. Sendo parcelado, o pagamento da primeira deve respeitar o prazo do dia 30 de novembro. A segunda parcela, por sua vez, precisa ser depositada na conta dos trabalhadores até o dia 20 de dezembro”, ressalta.
SUSPENSÃO DE TRABALHO
Quanto à suspensão do contrato de trabalho, Lailla Finotti destacou que as medidas adotadas pelo governo federal operam em ‘mão dupla’, vinculada as duas obrigações principais do contrato de trabalho: pagar salário – empregador; prestar o serviço – empregado. As quais reciprocamente deixam de ser exigidas quando a suspensão é aplicada. “Ao meu ver, podemos concluir que no caso da suspensão, os meses não trabalhados/suspensos não entrarão no cálculo do benefício – dentre os benefícios encontra-se o 13º salário, não sendo esta regra absoluta. Como se trata de suspensão contratual, com a sustação recíproca das obrigações contratuais entre empregado e empregador, a suposição acima é apenas parcialmente verdadeira, pois o cálculo do 13º tem um critério que, na prática, precisa ser observado caso a caso”, orienta a advogada.
A Lei 4.090, de 13 de julho 1962, estabelece que a gratificação de Natal corresponde a 1/12 da remuneração devida em dezembro, por mês de serviço, no ano correspondente. Esclarece ainda e que a fração igual ou superior a 15 dias de trabalho será havida como mês integral para os efeitos da regra de cálculo estabelecida. “Portanto, não é possível afirmar como regra geral que o período de suspensão simplesmente não será contado para o cálculo do 13º, pois isso dependerá da quantidade de dias que o trabalhador laborou no mês. Se o contrato, por exemplo, foi suspenso por 30 dias no período de 16 de março de 2020 a 14 de abril de 2020, o trabalhador laborou os 15 dias exigidos pela lei em março e abril e, portanto, esses meses serão contados normalmente para o cálculo da gratificação, correspondendo a 2/12. Logo, nesse exemplo a suspensão não teve qualquer efeito jurídico no cálculo do 13º. Por outro lado, se em razão da suspensão do contrato, o trabalhador não laborou num determinado mês pelo menos os 15 dias exigidos pela norma, aí sim este mês não será contado para o cálculo do 13º”, argumenta Lailla Finotti.
REDUÇÃO DE JORNADA E SALÁRIO
No caso apenas da redução da jornada, o trabalhador continua desempenhando suas funções, ainda que em jornada inferior à usual,e, portanto, o período será contado para o cálculo da gratificação de Natal (13º salário). No entanto, a Lei 4.090/62, estabelece valor específico do 13º: se ele for pago em duas parcelas, a primeira parte vai corresponder ao salário do mês anterior ao primeiro pagamento. Já a segunda vai corresponder à remuneração de dezembro; se for pago em uma única parcela, na data limite de 20 de dezembro, por exemplo, será considerado o salário do mês de dezembro. “Assim, considerando que a redução pode operar até o final do ano, entendo que tal instituto, a depender do caso específico, atingirá o 13º salário. Ou seja, se o funcionário estiver com a redução vigente operante até o dia 20 de dezembro, e for receber a gratificação natalina em parcela única, o pagamento desta se baseará ao valor pago com os efeitos da redução.
Cumpre ainda registrar que se a redução afetar a quantidade de dias trabalhadas no mês e corresponder ao período menor que 15 dias/mês, o mesmo deixará de ser contado para a gratificação natalina, exigidos pela norma, afetando ainda mais o valor do 13º”, observa Lailla Finotti.
DIVERGÊNCIA IDEOLÓGICA
Segundo a advogada, todas as explanações compõe um parecer ideológico, podendo haver entendimentos contrários. “Estamos vivenciando um momento excepcional. Me baseei em artigos de lei e na essência dos institutos. No entanto, considerando a excepcionalidade, os juízes e/ou os legisladores podem promover uma outra leitura do caso, visando a proteção da parte vulnerável (empregado) e decidir, ou até mesmo editar novas leis, com o conteúdo contrário a esse parecer”, finaliza a advogada.