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‘É só uma boneca?’ – O que está por trás de adultos que cuidam de bebês reborn como se fossem reais

Por Andre
marcele campos
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Você já se deparou com um vídeo de alguém ninando um bebê com ternura, cobrindo com manta, dando mamadeira… e só depois percebeu que não era um bebê de verdade?
São os chamados bebês reborn – bonecos hiper-realistas que imitam até o peso, a textura da pele e os sons de um recém-nascido. E eles não são mais exclusividades de colecionadores: têm sido usados em vídeos emocionantes, terapias… e também, em alguns casos, como instrumento de simulação para obter benefícios sociais.
Mas por que alguém trata uma boneca como se fosse um bebê? O que está por trás desse fenômeno que mistura afeto, dor e, em certos casos, até tentativa de fraude?
Nem sempre é brincadeira
Para muitas pessoas, o bebê reborn é mais do que um objeto – é um símbolo afetivo profundo. Pode representar um filho perdido, um sonho não realizado, ou uma forma de lidar com o vazio emocional. A psicologia explica que esse comportamento se relaciona a algo chamado “objeto transicional”, um recurso simbólico que ajuda a lidar com perdas, lutos ou traumas.
A pessoa sabe que é uma boneca, mas isso não diminui a carga emocional que aquele objeto carrega.
O cérebro acredita: o afeto é real
A neurociência mostra que, ao cuidar de um reborn, o cérebro ativa áreas relacionadas ao vínculo, ao cuidado e até ao prazer – como o sistema límbico e as vias da dopamina. Em outras palavras: mesmo que a lógica saiba que é uma boneca, o afeto é sentido como se fosse real. Para quem viveu traumas, abandono ou infertilidade, por exemplo, essa pode ser uma forma de elaborar a dor.
Quando o cuidado vira alerta
No entanto, nem todo caso é saudável ou simbólico. Em quadros psiquiátricos mais graves, como a esquizofrenia, pode haver perda de contato com a realidade, com pessoas acreditando de fato que o boneco é um bebê vivo. Isso se encaixa em delírios e requer acompanhamento profissional. Também há registros de uso intenso por pessoas com transtornos de personalidade, dissociação ou trauma complexo, como forma de manter um tipo de “vínculo reparador”.
E quando há má-fé?
Mais recentemente, surgiram relatos de pessoas usando bebês reborn de forma intencional para simular maternidade e tentar obter benefícios indevidos, como atendimento preferencial em serviços de saúde, prioridade em filas do SUS ou acesso a auxílios sociais.
Há casos em que adultos vão a postos de saúde com o boneco no colo, cobrindo com mantinha, pedindo atendimento imediato, e só depois os profissionais percebem que não se trata de um bebê real.
Esse tipo de atitude levanta questões éticas e práticas. Além de sobrecarregar serviços já fragilizados, pode banalizar situações legítimas de sofrimento psíquico em que o bebê reborn é parte de uma vivência emocional autêntica – e não uma encenação.
O que tudo isso revela?
Vivemos em uma sociedade que julga rápido, mas escuta pouco. O uso de bebês reborn pode ser expressão de dor, solidão, trauma, ou até um pedido silencioso de ajuda. Em outros casos, infelizmente, pode ser sinal de manipulação ou transtorno não tratado.
Julgar sem compreender é perder a chance de cuidar de verdade – tanto de quem sofre em silêncio quanto de um sistema que precisa proteger quem realmente precisa.
No fim das contas, a pergunta que fica não é “por que alguém cuida de uma boneca como se fosse um filho?”
Mas sim: que tipo de sofrimento – ou estratégia – leva alguém a transformar o afeto em encenação?
E estamos preparados para escutar a resposta?
Marcele Campos
Psicóloga Especialista em Neuropsicologia (Avaliação e Reabilitação) e Análise do Comportamento Aplicada ao Autismo, Atrasos de Desenvolvimento Intelectual e Linguagem. Trabalha há mais de 28 anos com crianças e adolescentes. Proprietária da Clínica Neurodesenvolver.


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