A flexibilização do direito de uso exclusivo de uma marca

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Prevê o artigo 129 da Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/96) que a propriedade da marca se adquire pelo registro validamente expedido, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional. Deste direito de uso exclusivo, decorre, logicamente, outro: de exigir que terceiros se abstenham de utilizar signos (marcas) idênticos ou semelhantes àqueles já registrados.
Neste sentido, pode-se dizer que há violação do direito de exclusividade quando, para designar produtos ou serviços disponibilizados no mercado, são utilizados sinais que possam gerar confusão no consumidor ou que permitam associação com marca alheia anteriormente registrada.
Contudo, os Tribunais têm entendido que este direito de exclusividade não é absoluto, pois além de estar sujeito às exceções previstas na própria lei e está condicionado ainda ao equilíbrio com valores constitucionais, notadamente: a livre concorrência, liberdade de expressão e livre iniciativa.
Em recente decisão, a 3ª turma do Superior Tribunal de Justiça proveu recurso da Companhia de Bebidas das Américas – AMBEV e manteve o registro da marca nominativa “Liber”, apesar do inconformismo da recorrida que já havia realizado o registro da marca “Líder” e ingressou com a demanda judicial pleiteando a declaração de invalidade do ato administrativo que concedeu o registro (posterior) da marca nominativa à AMBEV.
No caso em referência houve sentença de procedência declarando a invalidade da marca nominativa “Liber”, sob o argumento de se tratar de expressão gráfica e foneticamente semelhante àquela registrada pelo autor – “Líder” -, cujos significados, ainda que distintos, são de difícil percepção pelo público consumidor, não podendo, portanto, as marcas coexistirem. Tal decisão foi mantida pelo TRF da 2ª região.
Quando o processo chegou no STJ, a relatora, ministra Nancy Andrighi, refutando o entendimento das instâncias inferiores, concluiu que a expressão “Líder” tem menor grau distintivo, pois se trata de termo de natureza comum e de pouca originalidade. Acrescentou ainda que as marcas em conflito apresentam significados completamente diversos – enquanto uma remete a situação de superioridade ou predomínio, a outra significa liberdade ou autodeterminação. Ponderou ainda que, apesar do longo tempo de convivência/coexistência entre as marcas, não foram deduzidas quaisquer alegações de consumidores que tenham se confundido com as marcas em questão.
Por fim, para fundamentar a decisão que deu provimento ao recurso da multinacional e julgou improcedentes os pedidos, a relatora destacou que a “Líder” atua basicamente no segmento de vinhos e espumantes, jamais tendo usado o termo “Líder” para qualquer cerveja – segmento no qual a Ambev utiliza a expressão “Liber”.
Assim, a decisão, a nosso ver, se revela acertada ao prezar pela livre concorrência e pela livre iniciativa, uma vez que, na prática, como bem analisou a ministra, a questão não configurou hipótese de aproveitamento parasitário, desvio de clientela ou concorrência desleal, práticas que realmente devem ser coibidas.

Izabela de Souza Cunha
OAB/RJ 174.265

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